Pensamento de hoje

Poder de um lado e medo do outro formam a base da autoridade irracional.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Rua São Luiz

Cul-De-Sac
“Nesta ruazinha, as casas em geral são pequenas;

não há lugar para prédios.

E as pessoas que moram nestas casas, às vezes muito jovens,

às vezes muito idosas parecem impregnadas de tranqüilidade

que reina no local.”

Moacyr Sclyar


Foi no inicio da década de 80 quando das aulas de urbanismo da erudita e douta professora Margareth Pimenta (e bota pimenta nisso), tive acesso a palavra francesa cull de sac, que no bom e velho português significa rua sem saída, porém em Frances é muito mais chique. De tão chique o modelo dos becos, ruelas e servidões que levam aos meios de quadras foram incorporados aos empreendimentos imobiliários modernos do fazer urbano, e hoje desenham os condomínios fechados que em resumo são ruas sem saída. É nesses cenários, principalmente o da rua sem saída que muitos resolveram ou gostariam de morar, mesmo que limitados em sua mobilidade encontram aconchego, onde vizinhos assumem pactos não ditos de comportamentos sociais, olham pelos nossos filhos como seus, cuidam de nossas janelas abertas quando não estamos se debruçam sobre nossos muros baixos para conversar, ou seja, nos inter-relacionamos.


Como a ruazinha tranqüila, poderíamos continuar apresentando outros cenários utópicos do espaço residual reconquistado: a pracinha, o mercadinho, a igreja e a escola, o barzinho da novas e velhas do futebol e da política entre outras. O que vem acontecendo é a desvalorização desses conceitos no trato do espaço urbano frente aos fatores das ditas técnicas do fazer a cidade, entre elas à busca do aumento dos percentuais de densidade populacional sem critérios de localização e do desenho urbano existente, alem de forte pressão do setor imobiliário na busca de lucro rápido. No médio e longo prazo esse modo operante trará como resultado problemas que apenas será vivenciado pelos usuários da antiga ruazinha tranqüila, pratica continua de socialização dos prejuízos.


Acostumados a aceitar esta continua forma de fazer legislação urbanística para o território da cidade, desconhecendo ou esquecendo cenários pontuais nos vemos diante de situações como o inicio da construção de edifício residencial multifamiliar na Rua São Luiz no bairro América. A lei que disciplina o uso e ocupação do solo na cidade de Joinville (Lei Complementar 27/96) dão plenos direitos a sua execução. Porém se voltarmos a fazer comparações sob a mesma lógica do inicio do texto, utilizando a lei em vigor sobre as exigências para execução de condomínios, explicitada a partir do art. 176, observamos que a via em questão não atende os requisitos necessários nas questões de mobilidade e acessibilidade quando da obtenção de alvarás para os citados empreendimentos imobiliários, cujas diferenças simplistas estão apenas em possuir matricula única e uma portaria de controle de acesso. Para que fique claro, basta utilizar os requisitos estabelecidos na tabela do art. 178, da mesma lei onde o condomínio fica obrigado quando ultrapassa 25 unidades residências a possuir via de rolamento igual ou superior a 6 metros e passeios com largura de 1,5 metros, obrigando a Rua São Luiz terem uma distancia entre os muros frontais de no mínimo 9 metros. Poderíamos ainda solicitar para a mesma rua a obrigação do art.181, onde define o desenho da praça de retorno com raio igual ou superior caixa da rua. Em tempo, ainda cabe perguntar para as entidades de segurança publica como seriam resolvidos ou atendidos as situações de emergências no local, porém os fazejadores de plantão usarão tal questionamento como motivo para replica, acusando-me de desejar mal alheio. O antagonismo de pratica legal x pratica de utilização sustentável do espaço fica demonstrado, sendo que infelizmente o caso da Rua São Luiz não ser único, exemplos estão em todas as partes da cidade.


Aceitar comodamente o que nos é imposto ou assistir o sentimento de incapacidade generalizar-se seria fatal sob dois aspectos: primeiro facilitaria a outros as formas do fazer planejamento urbano sem a presença do dialogo e do contraditório e segundo e mais importante é de fazer parte de uma cidade que não consigo me reconhecer. Essa cidade complexa precisa ter instrumentos de planejamento estratégico e diretrizes claros e atualizados, aprimorado periodicamente sob pena de perdemos o já complexo fio da meada. Estamos postergando intencionalmente (consciente ou inconsciente) a tomada de decisões sobre o futuro da nossa cidade, enquanto isso os cenários que desejamos e que restabelecessem nossa fé sobre um futuro possível, que nos torna mais otimistas e afetivos continuam desaparecendo ou sendo modificados, o que irrita: para pior.


Arno Kumlehn

Arquiteto e Urbanista

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado por participar do Blog